quarta-feira, novembro 19, 2025
Rio Grande do Norte

Rio Grande do Norte registra 825 crianças em “casamentos” ilegais

Foto: Alex Régis

O Rio Grande do Norte registra 825 crianças e adolescentes entre 12 e 14 anos vivendo em uniões conjugais, segundo dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O número coloca o estado na 17ª posição entre as unidades da federação e representa 2,4% dos mais de 34 mil registros de brasileiros nessa faixa etária que declararam viver algum tipo de união (civil, religiosa ou consensual). Especialistas alertam, no entanto, que, por se tratar de menores de até 14 anos, nenhum consentimento é válido legalmente, nem mesmo da família. Logo, é considerado estupro de vulnerável, passível de prisão que varia de 8 a 15 anos.

O IBGE alertou que os números se baseiam nas informações fornecidas pelos próprios moradores e não representam uma comprovação legal das uniões. Segundo o instituto, as respostas podem refletir percepções pessoais e incluir interpretações equivocadas ou erros de preenchimento. Ainda assim, o levantamento reforça o que organismos internacionais apontam há anos: o casamento precoce interrompe processos essenciais do desenvolvimento infantil e afeta sobretudo meninas — elas representam 77% dos casos no país.

Quando considerado o tamanho da população, o cenário potiguar ganha outra dimensão. Com 3,3 milhões de habitantes, o estado apresenta, proporcionalmente, 1 caso para cada 4 mil pessoas. Estados nordestinos mais populosos têm maior volume absoluto, mas, proporcionalmente, Pernambuco (1 caso para cada 4,6 mil habitantes), Ceará (1 para 4,3 mil) e Paraíba (1 para 3,7 mil) também figuram entre os que mais registram uniões precoces. O Rio Grande do Norte mantém proporção semelhante à de Alagoas (1 para 2,5 mil) e Bahia (1 para 5,2 mil).

Para a advogada Geyse Raulino, presidente da Comissão da Mulher da OAB/RN e que atua na área da família, os dados evidenciam um fenômeno social persistente, frequentemente associado à pobreza e à informalidade das relações. “É uma realidade ver adolescentes assumindo responsabilidades adultas muito cedo”, destaca. Contudo, a regra é clara: desde 2019, nenhum casamento com menores de 16 anos é permitido, sob qualquer justificativa. “Casamento antes dos 16 anos é nulo, como se sequer existisse”, afirma Raulino.

Ela reforça que relações envolvendo menores de 14 anos configuram, automaticamente, estupro de vulnerável, independentemente de consentimento ou suposta relação afetiva. “É irrelevante o consentimento da vítima menor de 14 anos”, cita, referindo-se ao entendimento consolidado pelo Supremo Tribunal Federal.

Além disso, os efeitos da união precoce têm consequências profundas, especialmente para meninas, vítimas em maior quantidade. A advogada lembra que 80% das adolescentes que casam até os 18 anos deixam a escola. A evasão, somada à maternidade precoce, limita o ingresso no mercado de trabalho e aumenta a dependência financeira. “Elas ficam mais suscetíveis à violência e à dependência econômica”, afirma.

As implicações legais atingem também responsáveis e adultos envolvidos, que podem responder civil e criminalmente, além de serem alvo de medidas aplicadas pelo Conselho Tutelar.

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Fonte: Portal Tribuna do Norte

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